O mal uso da filosofia em questões políticas


A filosofia é uma forma de investigação que esteve muito restrita no Brasil à alguns nichos, por uma série de questões históricas. Contudo, essa investigação pode ser aplicada a diversas áreas além dos campos próprios da filosofia em si, como na arte, na ciência, na cultura de massa, entre outras, contudo, ela tem sido muito mal aplicada nas redes sociais, autoajuda, letras de música, causas sociais e política. A busca pela filosofia é sempre um impulso muito bom, mas é necessário um certo cuidado ao utilizar conceitos filosóficos. 

Nos discursos sobre partidos e opiniões políticas, infelizmente, é muito comum aplicar conceitos de maneira errada ou citar filósofos de maneira contraditória com o que este escreveu. Em certos casos, une-se a ignorância de não conhecer bem o tema e trazer os filósofos(as) para dar maior autoridade intelectual ao discurso, como propositalmente para defender sua posição partidária. 

Alguns exemplos concretos: o mal uso do termo ideologia — infelizmente um termo filosófico praticamente desgastado pela banalização errônea deste –; há muitas leituras e citações equivocadas sobre Marx e os marxistas pela “direita”, como, pasmem, pela própria “esquerda”; em geral, a esquerda e a direita tendem também a citar erroneamente os liberais, quando se leem, efetivamente, os filósofos relacionados ao liberalismo; Nietzsche sendo citado como filósofo ateu, e mal usado por “direita” e “esquerda”; as descrições erradas das diversas teorias de gênero — “ideologia de gênero” não existe, existem teorias sobre gênero; entre outros. Infelizmente, há uma tendência nos discursos políticos de citarem mal filósofos(as), seja propositalmente ou por engano mesmo. 

Muitas pessoas buscam nos filósofos um apoio teórico para expressar suas visões de mundo, para pensar causas sociais, entre outros. A investigação filosófica pode ser um meio interessante para aprofundar estas questões, e quiçá produzir novas perguntas sobre estes problemas reais. No entanto, é importante ter cuidado de saber se efetivamente tal filósofo propôs algo, como foi proposto, ou se estou apropriando de um conceito, por exemplo, mas aplicando a outros problemas não previstos pelo filósofo(a). Tudo isso é possível de ser feito, mas é preciso ter em mente bem claro o que se está fazendo com o pensamento do filósofo(a). 

Pensemos nessa frase: “Tal filósofo(a) levou-me a pensar tal coisa”. Isso é sempre fantástico e a expressão deixa claro do que a pessoa pensou ao ter contato com o filósofo, porém seria interessante ter ciência se foi uma experiência pessoal ou se efetivamente, o filósofo(a) abordou dessa maneira a problemática. É diferente da frase: “O filósofo(a) X disse tal coisa”. Neste caso, é essencial ter clareza tanto em expressar o discurso citado, com honestidade e profundidade, mesmo que for para em seguida articular uma investigação própria. 

Principalmente nas causas sociais, muitas vezes a própria situação de quem a comunica pode servir de princípio a uma investigação filosófica fantástica, talvez até melhor que partindo de um conceito filosófico existente. 

Todo esse processo não implica que a pessoa ao utilizar conceitos filósofos tenha obrigatoriamente formação em filosofia. Só um cuidado mesmo com o uso dos conceitos, algo que todos podem fazer. 

 ©2017 Tiago de Lima Castro

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