Pular para o conteúdo principal

Nerdices Filosóficas – Obras de Fantasia e o poder da palavra


Autor: Tiago de Lima Castro
Vitrine: Valério Gamer
   



Hoje o artigo está um pouco diferente, pois ao invés de relacionar seja um personagem, seja um filme, seja um livro, ou seja, um quadrinho com algum filósofo ou tradição filosófica, o tema será geral. Por que em obras de Fantasia as palavras e a linguagem tem tamanho poder?

Elas foram tidas como algo poderoso desde o alvorecer da humanidade. Em praticamente todas as culturas a palavra e a linguagem foram elementos compreendidos de maneira mágica. Quantas religiões e seitas não tiveram palavras proibidas de serem ditas fora de uma classe específica?

Um dos grandes problemas da filosofia, como já abordada na primeira coluna, é conceituar alguma coisa, responder a pergunta: O que é? Já entre os primeiros pré-socráticos, como Parmênides e Heráclito essa discussão existe. Para o primeiro, a linguagem permite dizer o ser dessa coisa, permite responder a pergunta o que é, através daquilo que é estático e não se transforma. Já para Heráclito, só existe o vir-a-ser, o devir, a transformação, a mudança o movimento, daí a linguagem não poder conceituar o que as coisas realmente são. Essa discussão permeia toda a história da filosofia, permanecendo um debate sempre em aberto.

Por que então as obras de Fantasia trazem o elemento mágico através das palavras? Em Tolkien, uma palavra pode ser a chave de uma fechadura, por exemplo, sendo que a própria criação da Terra Média utilizou-se de música com palavras; em Harry Potter, as magias são realizadas com palavras de uma língua específica.

Uma explicação é que essas obras são inspiradas em mitologia e textos antigos. Mas não será uma resposta preconceituosa e simplista? Será que não há algo mais nesse uso mágico da linguagem e das palavras?

Na Fantasia, o poder de criação e manipulação da realidade através da palavra remete-se ai ao processo de conhecimento da realidade, o qual ocorre através da linguagem. Tudo necessita de um nome, um conceito. No momento em que se conceitua algo, é o momento em que essa coisa se torna real e familiar para as pessoas. Por isso, toda criança passa pela fase de perguntar: O que é isso? É o momento em que ela interpreta e cria sua própria realidade conceituando as coisas e ao mesmo tempo limitando essa realidade as suas conceituações. No cotidiano, quando se diz que alguém deve mudar seus conceitos, mostra-se o poder criador de compreensão da realidade das palavras e da linguagem.

Portanto, pode-se dizer que a Fantasia é a mais realista das ficções, pois ao tratar da palavra e da linguagem como criadoras de realidades, ela toca profundamente a possibilidade criadora da linguagem. Se a linguagem é criadora de nossa compreensão da realidade, não é a linguagem realmente algo mágico?


© 2013 Tiago de Lima Castro

Comentários

Postagens mais visitadas